Santa Tartaruga

"Let's get together and feel all right"



segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

ranço cansa
a humilhação
sob joelhos

toda sorte
paira sobre o não
um país de peito amarelo
país de olhos vermelhos

às duas da tarde
uma fração da bonança
a costa de zé arde
o pé de José descança

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

quando somos

tu és luz morena
eu lúdico tu poema
eu brilho tu cinema
eu tom tu ipanema

tu és vivo cheiro
eu folha tu tinteiro
eu sereno tu mosteiro
eu moço tu puteiro

tu és bendita menina
eu íris tu retina
eu sertão tu cajuína
eu carnaval tu colombina

segunda-feira, 19 de maio de 2014

Nego maravilhoso


é Paulinho da Viola,
e os menino jogando bola
é Gilberto Gil
como como nunca se viu
é o berço da escola
que embala Cartola
é Jards Macalé
na ponta do pé
é o B Negão
na estética do arrastão
é Tereza Cristina
no dia de sabatina
é Milton Nascimento
sol, flor, céu e vento
é Ataulvo Alves
para os orixás, mil salves
é Jovelina
mais lenda
que Helena, a grega
a linda
pérola negra
é Zica
que o povo suplica
é gente bamba
os Originais do samba
de roda e terreiro
na mão de Jackson do Pandeiro
o brasileiro sabe bem
dos breque de Jorge Ben
e da maestria
de Luiz Melodia
é Juçara Marçal
por bem ou por mal
é Pixinguinha
com feijão e farinha
é Wilson Batista
no coração do maquinista
é Wilson Moreira
no viaduto de madureira
é Arlindo Cruz
e Clementina de Jesus
Seu Jorge
e se não me foge
é Ismael Silva, Elza Soares, Falcão, Nelson Cavaquinho, Dona Ivone Lara, Nei Lopes, Black Alien, Sandra de Sá, Péricles, Carlinhos Brown, Martinho da Vila, Emicida, Alcione, Jair Rodrigues, Mano Brown, Candeia, Nelson Sargento, Jamelão, Zé Keti, Bezerra da Silva, Marcelo D2, Dicró, Sabotage, Jorge Aragão...

é tanto nego maravilhoso
que o mulato mais clarinho
já sai pagando de gostoso

sábado, 3 de maio de 2014

girassóis ou origamis

um dia, o cahorro de ana morreu e ela estava muito triste
rebeca, sua amiga, lhe deu um origami
isso foi há muitos anos e nem ana, nem rebeca se esqueceram
ana perdeu o origami numa mudança, acredita-se
três dias depois, téo o achou, a caminho da estação de trem. era tão bonito. ele o deu a clarice
e foi a última vez que se viram
clarice o pendurou em cima do berço de davi, cantou para ele e beijou sua testa.
tempos depois, davi o encontrou enquanto revirava pertences antigos e memórias tenras,
em busca de inspiração.
depois disso, entornou algumas lágrimas, guardou tudo e foi se deitar
e o sonho foi bom
o amor é uma coisa que voa de mão em mão
e seria amor também se fossem os girassóis de van gohg

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Sobre a guerra e o que se faz com ela

       Ultimamente, sigo meio alheio ao cerne de nossas pautas. Se é que ainda posso me incluir nos beneficiários dos "acontecimentos" cotidianos. Eu sei que meu bedelho não vai lá certeiro como o de meus colegas e mestres - que se expõem com bem mais dignidade que eu às questões que emergem nas creches publicitárias e universitárias (desculpem) - mas sei que há também quem ainda me releve e não se negue a saber como vivo tais pautas às suas margens.
       No meio de tantas bombas, cabeças, objetivas, ninjas e labaredas, sou eu o tal do marginal. Marginal principalmente porque nem me cabe
a convicção poética dos jornalistas
nem a pele rubra dos ativistas
ou a melancolia cética dos poetas.
Eu caberia na pauta, ora, se pudesse pagar para ver. Todavia, conquanto minha lamentação ainda se pareça com uma ferramenta inofensiva, esses atores me toleram. Por meu nobre discurso e revelações, grandes multidões (só se fala em massa) esperam. Eu os amo e temo desferir sobre eles, sobre mim, sobre nós o ensejo de uma coisa vã, que é a opinião. Principalmente a minha, maculada por profetas e abjetas filosofias. Ofereço, em vez disso o que me redime a omissão e garante um sono menos imperfeito. Singela e nem tão minha: reflexão.
      Acerca das mobilizações que se sucedem no país, seja lá qual for a motivação, penso que a reivindicação dos homens é fúnebre, pois é fio solto da memória e fruto da morte de muita gente. Nisso, pensei de entrevistar Drummond que, ironicamente já faleceu, mas continua ainda
(O) sobrevivente

Eu - Caríssimo, a recente conjuntura dos brasileiros em relação ao seu país lhe estimula os versos?

Drummond - Impossível compor um poema a essa altura da
                      evolução da humanidade.
                      Impossível escrever um poema - uma linha que
                      seja - de verdadeira poesia.


Eu - Acreditas que o atual momento do Brasil inflige consequências à poesia/à sua poesia?

Drummond - O último trovador morreu em 1914.
                      Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.
                      Há máquinas terrivelmente complicadas para as
                      necessidades mais simples.
                    

                      Se quer fumar um charuto aperte um botão.
                      Paletós abotoam-se por eletricidade.
                      Amor se faz pelo sem-fio.
                      Não precisa estômago para digestão.


Eu - A crença no progresso por meio dos aparatos (termo jurídico?) configura um equívoco para o senhor?

Drummond - Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
                      muito para atingirmos um nível razoável de
                      cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.
                   

                      Os homens não melhoram
                      e matam-se como percevejos.


Eu - E como o senhor sobrevive em meio a tais circunstâncias?

Drummond - Os percevejos heróicos renascem.
                      Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
                      E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.
                      (Desconfio que escrevi um poema.)


Eu - Obrigado, poeta.

Além da breve entrevista, outras propostas me deram cabimento para refletir. Eis os links (copiar e colar):

rolezinho - https://www.youtube.com/watch?v=737brquoD88

"Tá com dó, leva pra casa" (destaque para os comentários) - http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ta-com-do-leva-pra-casa-9077.html

batman, tolerância e ameaça comunista - https://www.youtube.com/watch?v=9_m40U2005E

Elegia 1938 - http://www.casadobruxo.com.br/poesia/c/elegia.htm

preocupação de Otto - https://www.facebook.com/Oficial.OTTO/posts/760094490684678?stream_ref=10

repórter cinegrafista morto por rojão - https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=UhIh7zk3rUM

Por tais ponderações, inferi, ou melhor, refleti que é possível dizer, vejam bem, dizer coisas belas a pessoas nem tão belas, já que o dizer só ganha beleza no ouvido dos outros; é possível fazer notícia ou poesia concomitante a uma guerra, mas para texto incompleto só vale publicar o do poeta; para o produto da coisa jornalística - a notícia, importa mais a bala, de quem quer que seja e para isso tanto vale tacá-la na cabeça de quem ama, clama ou verseja.
Mas há no meio disso uma terrível aflição que não notamos. A aflição que não nos suporta, talvez por sermos jovens, é a da palavra. Por submetê-la a inquisições, por fazê-la admitir vocação para ordem, dissabor ou opinião. A palavra não morre, apenas sofre. Por nossas vozes e textos, aplicam-se sentenças, veredictos, lamenta-se, xinga-se, a palavra sofre, decreta-se ordens, desordens, surras e cárceres, ela machuca, comove, conclama, ela é uma santa a palavra, não morre.