Santa Tartaruga

"Let's get together and feel all right"



segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Sobre a guerra e o que se faz com ela

       Ultimamente, sigo meio alheio ao cerne de nossas pautas. Se é que ainda posso me incluir nos beneficiários dos "acontecimentos" cotidianos. Eu sei que meu bedelho não vai lá certeiro como o de meus colegas e mestres - que se expõem com bem mais dignidade que eu às questões que emergem nas creches publicitárias e universitárias (desculpem) - mas sei que há também quem ainda me releve e não se negue a saber como vivo tais pautas às suas margens.
       No meio de tantas bombas, cabeças, objetivas, ninjas e labaredas, sou eu o tal do marginal. Marginal principalmente porque nem me cabe
a convicção poética dos jornalistas
nem a pele rubra dos ativistas
ou a melancolia cética dos poetas.
Eu caberia na pauta, ora, se pudesse pagar para ver. Todavia, conquanto minha lamentação ainda se pareça com uma ferramenta inofensiva, esses atores me toleram. Por meu nobre discurso e revelações, grandes multidões (só se fala em massa) esperam. Eu os amo e temo desferir sobre eles, sobre mim, sobre nós o ensejo de uma coisa vã, que é a opinião. Principalmente a minha, maculada por profetas e abjetas filosofias. Ofereço, em vez disso o que me redime a omissão e garante um sono menos imperfeito. Singela e nem tão minha: reflexão.
      Acerca das mobilizações que se sucedem no país, seja lá qual for a motivação, penso que a reivindicação dos homens é fúnebre, pois é fio solto da memória e fruto da morte de muita gente. Nisso, pensei de entrevistar Drummond que, ironicamente já faleceu, mas continua ainda
(O) sobrevivente

Eu - Caríssimo, a recente conjuntura dos brasileiros em relação ao seu país lhe estimula os versos?

Drummond - Impossível compor um poema a essa altura da
                      evolução da humanidade.
                      Impossível escrever um poema - uma linha que
                      seja - de verdadeira poesia.


Eu - Acreditas que o atual momento do Brasil inflige consequências à poesia/à sua poesia?

Drummond - O último trovador morreu em 1914.
                      Tinha um nome de que ninguém se lembra mais.
                      Há máquinas terrivelmente complicadas para as
                      necessidades mais simples.
                    

                      Se quer fumar um charuto aperte um botão.
                      Paletós abotoam-se por eletricidade.
                      Amor se faz pelo sem-fio.
                      Não precisa estômago para digestão.


Eu - A crença no progresso por meio dos aparatos (termo jurídico?) configura um equívoco para o senhor?

Drummond - Um sábio declarou a O Jornal que ainda falta
                      muito para atingirmos um nível razoável de
                      cultura. Mas até lá, felizmente, estarei morto.
                   

                      Os homens não melhoram
                      e matam-se como percevejos.


Eu - E como o senhor sobrevive em meio a tais circunstâncias?

Drummond - Os percevejos heróicos renascem.
                      Inabitável, o mundo é cada vez mais habitado.
                      E se os olhos reaprendessem a chorar seria um segundo dilúvio.
                      (Desconfio que escrevi um poema.)


Eu - Obrigado, poeta.

Além da breve entrevista, outras propostas me deram cabimento para refletir. Eis os links (copiar e colar):

rolezinho - https://www.youtube.com/watch?v=737brquoD88

"Tá com dó, leva pra casa" (destaque para os comentários) - http://www.cartacapital.com.br/sociedade/ta-com-do-leva-pra-casa-9077.html

batman, tolerância e ameaça comunista - https://www.youtube.com/watch?v=9_m40U2005E

Elegia 1938 - http://www.casadobruxo.com.br/poesia/c/elegia.htm

preocupação de Otto - https://www.facebook.com/Oficial.OTTO/posts/760094490684678?stream_ref=10

repórter cinegrafista morto por rojão - https://www.youtube.com/watch?feature=player_embedded&v=UhIh7zk3rUM

Por tais ponderações, inferi, ou melhor, refleti que é possível dizer, vejam bem, dizer coisas belas a pessoas nem tão belas, já que o dizer só ganha beleza no ouvido dos outros; é possível fazer notícia ou poesia concomitante a uma guerra, mas para texto incompleto só vale publicar o do poeta; para o produto da coisa jornalística - a notícia, importa mais a bala, de quem quer que seja e para isso tanto vale tacá-la na cabeça de quem ama, clama ou verseja.
Mas há no meio disso uma terrível aflição que não notamos. A aflição que não nos suporta, talvez por sermos jovens, é a da palavra. Por submetê-la a inquisições, por fazê-la admitir vocação para ordem, dissabor ou opinião. A palavra não morre, apenas sofre. Por nossas vozes e textos, aplicam-se sentenças, veredictos, lamenta-se, xinga-se, a palavra sofre, decreta-se ordens, desordens, surras e cárceres, ela machuca, comove, conclama, ela é uma santa a palavra, não morre.