Santa Tartaruga

"Let's get together and feel all right"



sábado, 25 de setembro de 2010

À Senhora Modernidade.

  Esse século maravilhoso que a vida do novo zé contempla está um tanto supremo. As novas modas, o novo senso comum, as tendências da estação, a new popular musication rebolation, o arco-íris fazendo música, o casamento gay, os pretos e as mulheres querendo ser homens brancos, os best-sellers, as redes sociais, a intrépida justiceira opinião pública e tudo mais. Enfim, toda a massa metamórfica da primeira década do século é mesmo soberana.
  Com toda a humildade de um pobre suburbano latino americano, gostaria, encarecidamente, de pedir um espacinho miúdo, que pode ser entre o comercial e o merchandising, pro saudosismo cultural.
Para aquele mendigo que já foi milionário.
  Vejam o senhor Machado de Assis, coitado. Que já fora tão aclamado em sua literatura. Hoje tão desdenhado. Caiu dos romances para os trechos pequenos dos livros didáticos. Até história em quadrinhos o coitado já virou pra ver se despertava algum interesse. Jorge Amado, com uma sacada mais publicitária, arriscou ir pro cinema. Se deu certo eu não sei. Sei que gostei e guardei os comentários pra mim, por falta de alguém pra discutir.
Chico Buarque de Holanda, que não é bobo nem nada, garantiu logo seu quinhão nas ondas da MPB FM, Caetano e Gil fazendo parcerias com a moçada a torto e a direito. Tudo pra não cair no esquecimento.
Aliás, e esse tal de rádio né... Não é que o danado ainda não foi pra sucata.
É radinho, quem te viu, quem te vê. Tu que fostes tão pomposo, jactancioso, todo pimpão, com suas donas de casa à volta para ouvir a novela. É radinho, hoje elas estão sabendo da novela até mesmo antes da televisão. E ainda nessa mesma, Dom Vinícius e toda a Bossa tem que esperar a vez do Maneco para ter um espacinho em horário nobre. Isso enquanto o velho não morre, né.
Agora, que mané Portinari e Tarsíla que nada. Manda aí um tubo de jet que a gente vai tacar o nome, mané.
Eu estou vendo umas viagens meio psicodélicas, com bala (que não é a juquinha), com ácido(que não é o sulfúrico), nas salas e nuns muros sujos, mas a garotada anda dizendo que é arte. Bom, isso é lá com a galera de 22 que foi dar asas a essa tal de arte moderna. Naquele tempo era moderna. Hoje é ultrahípermegamaster moderna.
Nem o velho Drummond escapou da new wave moderna. Esses dias ouvi alguém comentar dele. Aí outro candango perguntou: "Esse daí 'num' é aquele careca da pedra no meio do caminho?"
É. É bom saber que essa juventude ainda se lembra do velho poeta. Que deprimente.
  Oh, mas veja bem, dona Modernidade, me desculpe aí se eu acabei faltando com o respeito. Não queria perder a humildade, até porque estou aqui lhe pedindo um favor. Mas é que "Tem certos dias em que eu penso em 'minha gente' e sinto assim todo o meu peito se apertar..." Eu to meio assim compadecido dessa poesia e literatura que ficam batendo nas portas das bibliotecas, suplicando um lugarzinho empoeirado lá nos fundos; dessa música brasileira esclerosada que fica zanzando pra lá e pra cá com essa faixa de Miss pendurada, escrito Popular enquanto ninguém a conhece mais; e desse cinema que fica implorando a aprovação dos americanos, como aquele aluno que quer passar de ano e fica aporrinhando a professora por uma estrelinha em seu caderno.
  Com toda a humildade, dona Modernidade, tende piedade.

5 comentários:

  1. Se algum desconhecido ler esse post,e se esse desconhecido for alguém um pouco mais velho, vai imaginar "Nossa, alguém que ainda lembra das coisas do nosso tempo";
    Se for alguém no auge dos seus 15,16 anos, vai pensar "afinal, do que esse garoto latino americano tá falando?";
    Mas pode ser que seja alguém da nossa idade que diga "Enfim, pude encontrar alguém que ainda valorize o que realmente é bom".
    Será? rs

    É, definitivamente, você é meu complemento escrito.

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  2. Concordo em gênero, número e grau.

    E vou aproveitar o ensejo pra comentar algo também: Dá no saco essa pós modernidade, na qual qualquer coisa genérica feita de qualquer maneira vira algo "artístico e pós moderno", na falta de uma classificação mais específica.

    Acabou-se a essência gostosa e realmente criativa das coisas antigas.

    E pra não esquecer:
    "Alan, seu doidão!"

    Gostei do post!

    Abraços!

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  3. Pra entrar na onda da mulecada a gente teria de parar de viver das ossadas de nossos ídolos mortos e esquecidos.
    "Que Madonna o que, se temos agora a Lady Gagga!" eu ouvi de um menino de 15 anos.

    Esses ritmos eletrônicos frenéticos e descompassados só dão espaço à alienação.
    A músca que inspira, que apaixona, se perdeu em alguma cova junto a algum de seus poetas.
    Como disse meu querido Kiiiiilber(daquele jeito que você fala), essa arte genérica que é feita nas coxas, ainda ganha classificação; ah, essa tal de Pós-Modernidade.

    Posso ser nostálgica demais e até não ter muitos argumentos contra esses rumos que a Modernidade vem dando à musica, à arte, ...
    Mas eu ainda prezo por meu fim de tarde na pedra do arpoador, na companhia de meus queridos velhos e ultrapassados cantores.

    ps.:Até que você não é tão bocó.

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  4. Um grito à boa música. Um salve à arte de verdade. Um viva à cultura inteligente.

    Hoje, os queridinhos são coloridos e formam uma família de alienados; a musa parece ter saído de uma irreverente fábrica de robôs com parafusos a menos; o astro vive precocemente a síndrome do estrelismo.

    A pós-modernidade e os modernos desse tempo já não sabem o que é bão, meu irmão.

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  5. Alan, que maravilha ler um texto como o seu, especialmente, por descobrir estar uma pessoa de escrita de primeira linha entre os meus alunos. Em tempos em que a poesia precisa implorar por um espaço qualquer empoeirado, na era do rebolation, vale a pena dar aula, até pelo fato de vc e tantos outros compensarem as idiotices que ouço por aí. às vezes, até em sala de aula.
    PARABËNS e VIVA A PALAVRA (BOA PALAVRA). SEMPRE!!!!!
    IVANA

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